Por: Adriano Ferreira / Colaboração para Tilt, em São Paulo
Uma pesquisa publicada no periódico acadêmico Australian Field Ornithology, na Austrália, relatou a surpresa de cientistas que, durante um experimento de rastreamento de pássaros, descobriram que o grupo de aves agiu em conjunto para remover os dispositivos eletrônicos, exibindo sinais de colaboração e comportamento altruísta.
O estudo consistiu em colocar aparelhos para monitorar o comportamento de um grupo de pegas-australianas (Cracticus tibicen) — ou “Magpies”, espécie de ave com parentesco do corvo. Ainda nas instalações, os pássaros se ajudaram para retirar o que entenderam ser um “parasita”.
Dominique Potvin, professora sênior de ecologia animal na Universidade de Sunshine Coast, em Queensland, na Austrália, contou que os esforços para as remoções começaram depois de 10 minutos após a instalação do último rastreador em uma das aves. “Foram mais espertas do que nós”, disse a cientista em um post no blog The Conversation.
A pesquisadora relatou observar uma fêmea adulta, sem um dispositivo, usando o seu bico para tentar remover o arreio de um pássaro mais jovem. Em seguida, em uma questão de horas, a maioria dos demais aparelhos já tinham sido removidos. No terceiro dia, o macho dominante do grupo teve seu rastreador retirado sem problemas.
O que rolou
O experimento tinha como foco inicial aprender de um modo mais profundo sobre os movimentos e as dinâmicas sociais das pegas-australianas, como a distância percorrida por dia e comportamentos sociais que têm influência de acordo com o sexo, idade e hierarquia no grupo.
Para isso, instalaram um rastreador que pesava menos de um grama, que tem um formato parecido com um arreio — aquela estrutura usada para vestir um cavalo em uma cavalgada ou hipismo, por exemplo. Projetado para driblar dificuldades de instalação em pássaros de pequeno e médio porte, o plano envolvia instalar e recolher os aparelhos quando os pássaros retornassem ao ponto inicial, onde foram treinados para se alimentar.
Pouco depois, os cientistas constataram que as pegas-australianas exibiram o que pode ser considerado um “comportamento de resgate”, demonstrando sinais de inteligência social, altruísmo e resolução de problemas.
O estudo piloto incluiu um treinamento para o grupo de aves, instalando as arreias rastreadoras em cinco delas. O dispositivo, de estrutura durável, só seria removível com o uso de um ímã, que não poderia ser facilmente removido. No entanto, este ponto foi explorado pelas Magpies, que bicaram o aparelho para soltá-lo.
Por que isso importa
“Não sabemos se era o mesmo indivíduo ajudando um ao outro ou se compartilhavam tarefas, porém nunca havíamos lido sobre nenhum outro pássaro cooperando dessa maneira para remover dispositivos de rastreamento”, declarou Potvin ao portal australiano ABC.
Conforme afirmam os cientistas do experimento, não existe uma resposta clara se os Magpies testaram diferentes partes do arreio antes de conseguirem retirá-lo no ponto mais fraco.
Caso a primeira suposição seja verdadeira, isso pode indicar flexibilidade cognitiva e aprendizado, juntamente a uma capacidade de resolução colaborativa de problemas. Por falta de testes específicos para comprovações, ainda não se sabe se as pegas-australianas focaram as “bicadas” em um ponto fraco do arreio de forma organizada, ou se as tentativas foram ao acaso.
Para Mônica Ponz Louro, professora de Etologia (estudo de comportamento animal) no curso de Ciências Biológicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo, o altruísmo observado nos Magpies mostra que animais procuram agir em benefício de outros da mesma espécie sem que exista necessariamente uma recompensa ou benefício para si próprio.
“Aparentemente os pesquisadores se surpreenderam ao observar o comportamento de adultos, mais experientes, procurar libertar as aves mais jovens deste dispositivo, uma vez que deve incomodar o animal e até dificultar movimentos necessários para o voo”.
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