Por: Janaína Silva / Colaboração para o VivaBem
Quem já tentou inserir uma tarefa nova no dia a dia, praticar uma atividade física, deixar de adoçar o café ou, até mesmo, modificar um pouco características da personalidade, como ser mais extrovertido, pode ter se perdido no caminho.
Certamente, há os que a partir de uma decisão atingem o êxito e deixam para trás hábitos que não desejavam mais. Mas a transformação depende de ações que vão além do apenas querer, como muitos pensam. Buscar o autoconhecimento e planejar a ruptura de um padrão são caminhos possíveis para tornar sua versão de você mesmo melhor amanhã.
Quantas vezes já escutamos alguém explicar que não pode mudar porque “é assim mesmo”? Quantas vezes você sentiu que não consegue agir de maneira diferente porque existem certas tendências dentro de você? Em todos esses casos, estamos falando sobre a nossa personalidade: o conjunto de características que nos definem e nos tornam únicos. Mas…até que ponto podemos mudar a nossa personalidade?
A personalidade não é algo completamente definido pelos nossos genes. Graças a isso podemos intervir e realizar mudanças. Na verdade, se você mesmo fizer um pequeno exercício e olhar para trás, vai perceber que conservou partes da sua personalidade e outras não. Talvez agora você seja mais amável ou mais arisco, mais organizado ou mais bagunceiro, mais melancólico ou mais corajoso, etc.
Por isso, e como se trata de um conceito tão importante em psicologia, nesse artigo vamos falar sobre o que é a personalidade e como podemos influenciar de maneira consciente as mudanças que ocorrem nela.
O que é a personalidade?
Existem várias definições de personalidade, muitas na verdade. No entanto, a maioria está de acordo que a personalidade é uma construção psicológica que se refere ao “conjunto de traços (características psíquicas) que um indivíduo tem e que determinam suas tendências de comportamento, pensamento e emoção.
Dentro das características de personalidade que existem, podemos encontrar dois tipos: os traços de temperamento e os traços de caráter. Ao passo que os traços de temperamento são tendências de comportamento que têm maior carga genética e biológica (nós nascemos com essas características), a definição ou a concretização dos traços de caráter seria, na verdade, o resultado da interação entre a pessoa e o ambiente.
Ambiente influencia e pode facilitar
Para começar, é preciso compreender que o ambiente no qual as pessoas estão inseridas impacta o comportamento. Muitas encontram, ou desenvolvem, as condições ideais de maneira mais favorável.
“Quando existem circunstâncias propícias, dará menos trabalho adotar uma nova atitude. Para exemplificar, se alguém decide não tomar mais refrigerante, o fato de morar em um local no qual não tenha fácil acesso à bebida será benéfico. É diferente se na casa a geladeira estiver cheia do item”, contextualiza Amanda Barroso de Lima, neuropsicóloga e coordenadora do curso de pós-graduação em neuropsicologia clínica comportamental no IBAC (Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento).
Querer não é suficiente para desenvolver uma nova característica. Vai muito além da força de vontade. “É preciso ter um bom nível de autoconhecimento e saber mexer no ambiente no qual se vive para que se torne mais provável agir de determinadas formas”, explica Lima.
Outro aspecto que leva a ações e comportamentos distintos é como isso afeta o entorno e o impacto que gera às pessoas. A neuropsicóloga esclarece que é possível mudar quase tudo no jeito de cada um, mas vai depender da maneira como isso influencia e como reagem aqueles com os quais convive. “Decidir fazer algo pode até ajudar a organizar o que precisa ser feito, mas o comportamento tem a ver com o que muda à volta quando se age de determinada maneira e como impacta os indivíduos.”
Não é do dia para a noite
Não é provável interromper um hábito ou alcançá-lo de um dia para o outro. No entanto, não é impossível. “Demanda tempo, paciência e perseverança, mas alguns são capazes de alcançar essa conquista quando desejam assumir com seriedade a mudança de costumes. Os hábitos estão diretamente relacionados a transformações”, afirma Marcella Pinto Maia, psicóloga clínica e hospitalar no HSPE (Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo).
É uma somatória de fatores. Além do meio no qual se vive, existe o estímulo para começar, a necessidade, como um novo emprego e as características biológicas do indivíduo. Modificar, por exemplo, traços da personalidade —estáveis, centrais e que fazem parte da essência de uma pessoa e a definem— exigirá mais recursos e tempo comparado a uma atividade simples do dia a dia, como descer do ônibus um ponto antes e caminhar até o trabalho.
“Não consiste em apenas falar que fará diferente para mudar. Afinal, é um processo que envolve uma parcela biológica e outra de aprendizado, moldada ao longo dos anos por meio da interação com o meio, e, certamente, um processo mais resistente a mudanças”, assegura Natanael Antonio dos Santos, professor em neurociências e comportamento da UFPB (Universidade Federal da Paraíba).
A personalidade engloba fatores físicos, biológicos e socioculturais, vinculando predisposições desde o nascimento, as quais se somam às experiências adquiridas no decorrer do tempo. Os traços de temperamento e de caráter dão forma à personalidade. “Os de temperamento, como a impulsividade, possuem maior carga genética e biológica e acarretam maior resistência às mudanças”. Já os de caráter, resultantes da conexão entre o indivíduo e o meio, têm mais probabilidade de serem transformados”, esclarece Maia.
Saiba o que faz sentido para você
Muitas vezes, o processo parece ser mais fácil para alguns. Alguém que acorda e decide começar a correr, por exemplo, pode ter conseguido pelo fato de ter as ferramentas necessárias: um local perto para correr, tênis e roupa apropriados. “É primordial um conjunto de fatores para adotar uma prática. Muitos falham repetidamente porque copiam a ideia de outro. É preciso autoconhecimento para entender o que funciona para cada um. Repetir o que um conhecido pratica pode não fazer sentido. Não é apenas executar a rotina que o influenciador digital ou o autor do livro mandou. Quem dera fosse tão simples”, analisa Lima.
“Se uma pessoa está infeliz com seu comportamento e é capaz de identificar o prejuízo que ele acarreta em sua vida, ela precisa estar determinada a mudar”, ilustra Maia. Segundo ela, existem fatores externos e internos que contribuem na mudança de comportamento, como a construção da personalidade, que tem associação direta com as condutas adotadas ao longo da existência, além dos valores culturais e sociais, os quais ajustam as experimentações e estimulam, também, a maneira como age.
Santos comenta que a habilidade de criar novos hábitos depende das características de cada um. “Alguns apresentam muita facilidade e outros, não, até mesmo com o acompanhamento ou ajuda de um profissional capacitado. Na prática, é muito difícil as pessoas terem sido condicionadas de uma forma e de uma hora para outra transformarem seu comportamento. A mudança comportamental requer treino e exercício mental. É preciso trabalhar as crenças, de preferência, com a ajuda de profissionais da área comportamental e da saúde.”
Cuidado com a autossabotagem
Em alguns momentos, desconfia-se até que a própria pessoa atrapalhe o processo de transformação, apesar de existir, também, muita falta de organização e cobrança interna. De acordo com Lima, a autossabotagem ocorre quando o que foi planejado irá exigir mais do que foi idealizado. “É fundamental ter organização, ir pouco a pouco, comemorar os passos pelo caminho sem pensar somente na conclusão.”
Quando a meta final fica muito longe, alerta a neuropscicóloga, a tendência é buscar um prazer imediato que pode dar espaço a algo oposto ao planejado. “Toma-se o caminho mais curto, gerando satisfação instantânea ao invés de escolher o caminho de longo prazo.”
“A autossabotagem é um comportamento que faz o indivíduo sentir prazer pelo desprazer”, diz Maia. É importante que a pessoa seja capaz de se conscientizar da gravidade da situação e ter a percepção do próprio boicote, que pode acarretar prejuízos para o seu futuro.
Fontes: Amanda Barroso de Lima, neuropsicóloga clínica, mestra em ciências médicas e coordenadora do curso de pós-graduação em neuropsicologia clínica comportamental no IBAC (Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento); Marcella Pinto Maia, psicóloga clínica e hospitalar no HSPE (Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo); Natanael Antonio dos Santos, PhD em neurociências e comportamento e professor em neurociências e comportamento da UFPB (Universidade Federal da Paraíba).
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