Por: Flávia Santucci / Colaboração para o VivaBem
Em algum momento da vida, você já deve ter feito algo que não tinha vontade, mas acabou persuadido por conta de uma situação específica. Isso porque, quando uma pessoa é desafiada, geralmente, tem o impulso de aceitar o que lhe é proposto e provar sua capacidade de realizar determinada ação. É assim que funciona a psicologia reversa, técnica utilizada para conseguir com que alguém faça voluntariamente o contrário do que pretendia, sem impor uma ordem diretamente.
De acordo com o psicólogo clínico Flavio Oliveira, CEO da Buscoterapia, plataforma de atendimento psicológico online e presencial, essa manipulação pode ser efetiva tanto individualmente quanto no coletivo, mas deve ser utilizada exclusivamente como forma de encorajamento e desenvolvimento do indivíduo. “É fundamental que o uso dessas técnicas respeite as vontades, os limites e a subjetividade de cada um, caso contrário e se mal aplicada, pode-se perder a confiança na relação, além de uma queda na autoestima da pessoa”, revela.
Ainda de acordo com o especialista, dentro da psicologia reversa, desafiar uma pessoa a fazer algo que ela acredita que não consegue por meio de uma aposta, por exemplo, pode ser algo positivo. Já induzir a pessoa a tomar decisões que podem não beneficiá-la é completamente arriscado. “Podemos incentivar um amigo que está passando por um momento de descrença, mas que tem a capacidade de fazer determinada coisa, dizendo que ele não tem condições de fazer algo tão bem, assim ele poderá se motivar apenas para nos provar o quanto é capaz. Por ser considerada uma espécie de truque psicológico, ela deve ser usada para fins positivos, para buscar autonomia e desenvolvimento da pessoa e nunca trabalhada para influenciar decisões negativas”, diz.
Não é bom fazer uso com crianças e adolescentes
Como qualquer técnica, a psicologia reversa deve ser utilizada com o objetivo de extrair o melhor de uma pessoa ou público, como explica a psicóloga Mara Leme Martins, especialista em medicina do comportamento. O método pode ser um incentivo nos estudos, no condicionamento físico, no relacionamento, na alimentação e até mesmo na carreira. Mas deve ser evitado em manipulações de crianças, adolescentes ou idosos e na tentativa de se obter proveito e benefícios pessoais ou induzir a pessoa a atos que coloquem em risco a segurança física e psíquica.
“Ameaças não funcionam. Geram medo e privação, fazendo com que os objetivos não sejam alcançados”, diz a psicóloga.
Outro ponto importante é que o uso contínuo dessa técnica pode ser percebido em algum momento. No caso de crianças, a psicologia reversa pode, inclusive, prejudicar o desenvolvimento da confiança entre pais e filhos.
“Ela pode ser usada pelos pais para, secretamente, conseguirem que os filhos façam o que eles desejam. É importante dizer que o uso contínuo dessas técnicas em algum momento pode ser percebido pela criança, que pode passar a enxergar os pais como manipuladores e desonestos, prejudicando o desenvolvimento da confiança entre eles e de sua autoestima”, ressalta Flavio Oliveira.
Como funciona o método
De acordo com Martins, a psicologia reversa consistem em fazer perguntas ou sugestões que podem ou não ser desafiadoras. A partir daí, vem a reação da pessoa. Por exemplo, alguém diz “aposto que você não consegue fazer este cálculo”. Isso vai desafiar a pessoa e fazer com que ela prove que é capaz.
Segundo a psicóloga Shana Wajntraub, a psicologia reversa pode ser explicada pela teoria de reatância psicológica, que diz que uma pessoa que tem sua liberdade de expressão, pensamento ou ação ameaçada ou reprimida, sente uma motivação natural a reagir para recuperar tal liberdade (ou senso de liberdade). “Esse efeito de reatância não é necessariamente ruim, pois buscamos nessa ação evitar influência ou manipulação sobre nosso comportamento”, diz
Outros meios eficazes de aplicar o método são a utilização da palavra “não” e também recursos de privação. “Você não consegue me ajudar?” é uma pergunta que faz com que, se a pessoa não consegue dizer não, pode gerar uma culpa nela, então ela pode ter o desejo de ajuda. “Este produto está se esgotando, temos apenas duas peças”, por exemplo, gera sensação de escassez e faz com que a pessoa deseje adquirir o produto, evitando que venha a pensar se realmente necessita dele.
Ainda de acordo com Martins, uma outra forma de abordagem é fazer com que a pessoa possa reagir ao fato que lhe foi exposto. “Será que esse é o melhor momento para você?”, a princípio, pode parecer uma simples opinião, mas faz com que a pessoa queira provar, demonstrar ou não perder a oportunidade.
Também vale dar à pessoa autonomia, fazendo com que ela tenha consciência de que está agindo pelo próprio desejo. “A abordagem sugerida é ‘a decisão é sua’. Assim, a pessoa se sente no controle e se abre para aquilo que você está sugerindo”, diz Martins.
Personalidade influencia na aceitação ou não
O método pode ser aplicado em qualquer fase da vida, mas isso não quer dizer que qualquer indivíduo vai aceitar. A personalidade e as características individuais de uma pessoa podem simplesmente fazer com que ela não acate a sugestão que lhe é apresentada.
Para Oliveira, é exatamente isso que determinará a necessidade da utilização da psicologia reversa. “Pessoas com boa autoestima, que se conhecem e que se sentem seguras dificilmente aceitam espontaneamente essa manipulação. Mas pessoas inseguras podem ser incentivadas através do reforço de sua autonomia, e pessoas reativas, resistentes e autoritárias, que não gostam de ser contrariadas, irritadas e com excesso de confiança, tendem a aceitar desafios apenas para confrontar e podem assim ser manipuladas por esse recurso”.
Especialista em comportamento, Mara Martins ressalta que é nessa hora que entra a necessidade de se compreender um perfil e a melhor forma de abordá-lo. “Em uma mesma situação, diferentes perfis vão achar uma forma de se sentirem vencedores, mas por meios diferentes. Não se obtém êxito, por exemplo, com abordagens extremamente competitivas com pessoas que têm o perfil altamente afetivo, onde colaborar é muito mais atraente do que competir e vencer. O troféu dessas pessoas é a colaboração. A moeda de troca de pessoas competitivas e pessoas afetivas é completamente diferente. Daí a importância de se estudar e de se observar o público que se deseja fazer essa abordagem”.
Além disso, por vezes, para escapar de alguma influência, as pessoas podem escolher opções diferentes daquela que realmente gostaríamos, ou mesmo nos autossabotar apenas para provar para alguém que somos livres, de acordo com Wajntraub.
Esse método de convencimento pode ser efetivo tanto no meio pessoal quanto no profissional, mas a psicóloga Mara Leme Martins vê com cautela o uso desse tipo de abordagem, independentemente do meio que se deseja aplica-lo. “Muitas pessoas, com o desejo de se sentirem aceitas, acabam entrando nesses desafios e acabam colocando em risco a sua saúde física ou psíquica”, diz.
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