Por EPTV1
A jovem trans de 21 anos que foi brutalmente espancada por três homens há seis dias, em São Carlos (SP), acredita que foi vítima de transfobia. “Eles falavam que viado vai para o inferno, que eu ia morrer, que não ia mais dali mais”, relatou em entrevista à EPTV, afiliada da TV Globo, nesta quinta-feira (4).
A trans, que preferiu não se identificar, foi agredida por três homens na sexta-feira (26), no bairro Cidade Aracy, em São Carlos. Ela teve os cabelos arrancados, as orelhas decepadas e recebeu várias facadas pelo corpo.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública, o crime foi registrado como tentativa de homicídio qualificado. “Diligências estão em andamento para identificação e prisão da autoria”, informou em nota.
Agressão
De acordo com a jovem, ela tinha ido até a casa de um amigo que mora em frente a mata em que ela foi agredida. E que chegando lá, chamou por ele e como o rapaz não estava, ela foi embora.
No caminho, ela foi surpreendida por um homem e puxada para o meio do mato. “Ele me puxou e quando ele foi me arrastando já tinha duas outras pessoas esperando lá. Um com um taco cheio de prego e outro com uma faca”, contou.
Assim que o homem que a levou para o meio do mato a soltou, um outro veio e lhe deu um chute na boca.
“Foi aí que começaram as agressões. Cortaram minhas duas orelhas, me deram vários golpes com faca na cabeça, nas costas”, relembrou.
A jovem foi agredida por mais de duas horas, até que os homens foram embora, possivelmente acreditando que ela estava morta.
Ela então se arrastou até a rua e pediu por socorro. Um carro que estava passando pelo local parou e avisou a família dela.
“Eu fui para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do Aracy mesmo, aqui perto do Antenor. Chegou lá, eles já começaram a me dar os primeiros socorro. Só que eles também me trataram na ala masculina, sendo que eu sou trans, eu sou feminina, me trataram na ala masculina. E depois eu fui transferida para a Santa Casa, não avisaram minha família, não chamaram a polícia”, disse.
Cinco dias depois das agressões, a jovem, após receber alta hospitalar, foi com a família até a DDM e registrou um boletim de ocorrência.
“Eu também estou indo atrás das providências, dos meus direitos, porque eu ainda estou um pouco meio chocada com isso. Estou com um pouco de trauma, não consigo sair, não consigo praticamente fazer mais nada”, lamentou.
Suposta negligência na notificação
A Comissão de Diversidade Sexual e Igualdade de Gênero da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) quer entender o motivo das unidades de saúde que atenderam a jovem não terem denunciado o caso para as autoridades policiais, já que desde dezembro de 2020, uma lei obriga os hospitais a notificarem em até 24 horas casos de agressão contra mulheres.
“Sempre que uma pessoa chega no estado em que ela chegou, obrigatoriamente o sistema de saúde tem que comunicar as autoridades. O que a gente tem conhecimento é que nem a UPA e nem a Santa Casa comunicaram, agora a gente, enquanto Comissão da Diversidade Sexual, a gente vai oficiar a Secretaria de Saúde para apurar se realmente teve essa negligência ou não”, disse a presidente da comissão, Camila Marques.
A comissão também pretende apurar o motivo da jovem trans ter sido atendida na ala masculina dos dois lugares.
“Eles atacaram o cabelo, o seio, o rosto, tudo aquilo que socialmente é lido como feminino. Então, isso caracteriza crime de transfobia, por outro lado, o próprio sistema ter tratado ela no masculino o tempo todo, ter colocado ela em uma ala masculina e não ter comunicado as autoridades policiais também caracteriza uma transfobia estrutural”, argumentou.
O que dizem a prefeitura e a Santa Casa
Em nota, a prefeitura, responsável pela UPA do Cidade Aracy, informou que, como a vítima estava em estado grave e com rebaixamento do nível de consciência, o procedimento feito foi o de praxe para qualquer tipo de atendimento desse tipo: estabilizar e encaminhar o mesmo para um serviço de atendimento avançado com UTI caso o quadro geral do paciente se agrave, deixando assim por conta da unidade de referência o protocolo para caso de agressão.
A supervisão da UPA reafirmou que atende todos sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, religião ou outra natureza, tratando a todos com o devido respeito e importância.
Já a Santa Casa, informou que a paciente deu entrada no hospital com o nome de registro e, por isso, foi acomodada em um quarto com homens. Disse ainda que nos quatro dias de internação, nem a paciente e nem as pessoas que foram visitá-la relataram qualquer constrangimento ou fizeram pedido para que ela fosse transferida para outro quarto.
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