Por: Kennedy Alecrim/Redação
Estudo mostra que, mesmo com altos PIBs agropecuários, municípios registram déficits em educação, desenvolvimento rural e proteção social. Mas as perquisas não fazem comparações com situações anteriores. Será que os dados não melhoraram ou não querem assumir isso ?
A narrativa de que a riqueza do agronegócio não garante qualidade de vida tem sido repetida por análises recentes, como o levantamento “Agro & Condições de Vida” da Agenda Pública. É verdade: municípios de forte produção agropecuária ainda apresentam baixos indicadores em saúde, educação, infraestrutura e desenvolvimento rural. No entanto, essa leitura muitas vezes ignora a linha de base histórica desses territórios e desconsidera os avanços que o campo experimentou a partir da consolidação do agro moderno.

Avanços em Rio Verde
Rio Verde, em Goiás, é um exemplo emblemático. Os dados do Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil mostram que, em 1991, o município apresentava níveis médios de desenvolvimento, com educação em patamares bastante baixos. Já em 2000, com a chegada de investimentos em grãos e agroindústria, o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) começou a avançar. Em 2010, o IDHM atingiu 0,754, classificado como “alto”, com destaque para a dimensão educação, que chegou a 0,656. Em pouco menos de duas décadas, o município saiu de uma realidade restrita para patamares de desenvolvimento superiores à média nacional do período.
Expansão econômica
As Contas Regionais do IBGE mostram que a partir de 2002, quando a série do PIB municipal passa a estar disponível, Rio Verde teve forte aceleração econômica. A base agropecuária consolidada na soja, a atuação da cooperativa COMIGO e a instalação de grandes plantas industriais, como a Perdigão, criaram um novo ciclo de emprego, renda e arrecadação. O PIB local avançou de forma constante, refletindo o fortalecimento da economia do Sudoeste Goiano.
O papel do agro na transformação
Estudos setoriais apontam que a modernização agrícola nos anos 1990 e 2000 foi decisiva para reconfigurar a realidade social de Rio Verde. A expansão da soja, o aumento da produtividade e a diversificação com a pecuária de corte e leiteira consolidaram a região como um polo nacional. Essa transformação não foi apenas econômica: as escolas municipais, os hospitais regionais e a infraestrutura urbana passaram a contar com recursos antes inimagináveis. Ignorar esse processo é perpetuar uma visão urbana que enxerga apenas a fotografia atual, sem considerar o filme completo das últimas décadas.
Desafios persistentes
É inegável que ainda há desafios. Os índices recentes de Condições de Vida (ICV) mostram que, mesmo entre os municípios que mais geram riqueza no agro, nenhum alcançou a marca de 0,60 no indicador que combina saúde, educação, proteção social, gestão pública e desenvolvimento rural. Em Rio Verde e em tantos outros, ainda faltam políticas sociais consistentes e investimentos estruturantes que transformem riqueza em bem-estar pleno. A crítica é válida, mas precisa ser contextualizada: não se trata de ausência de progresso, e sim de um processo em curso.
Uma crítica à visão urbana
Grande parte das análises que circulam sobre o agro parte de um olhar urbano, que esquece de comparar o “antes” e o “depois”. Em cidades como Rio Verde, a vida de milhares de famílias mudou radicalmente entre os anos 1990 e 2010. A universalização do ensino fundamental, a chegada de universidades, a expansão da rede de saúde e o aumento da expectativa de vida são conquistas palpáveis que vieram na esteira do crescimento agroindustrial. A cobrança por melhorias é legítima, mas precisa reconhecer que o agro acelerou mudanças que talvez demorassem décadas a mais se dependessem apenas da inércia das políticas públicas tradicionais.
Conclusão
A riqueza do agro não garante, por si só, qualidade de vida. Mas negar que ela tem sido motor de transformação em municípios do interior é uma injustiça com a própria história recente do Brasil rural. O desafio agora não é apontar o agro como vilão, mas sim articular a abundância de recursos que ele gera com políticas públicas capazes de transformar esse crescimento em bem-estar efetivo. O campo já deu o primeiro passo; falta ao poder público e à sociedade reconhecerem que a estrada foi encurtada graças ao agro, mesmo que ainda reste um longo caminho a percorrer.

Referências
- Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. (2013). Perfil do município de Rio Verde (GO). Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Fundação João Pinheiro. Recuperado de http://www.atlasbrasil.org.br
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2024). Contas regionais: Produto Interno Bruto dos municípios 2002-2021. IBGE. Recuperado de https://www.ibge.gov.br
- Agenda Pública. (2025). Agro & condições de vida: análise dos 50 maiores PIBs agropecuários do Brasil. São Paulo: Agenda Pública.
- Campo Grande News. (2025, 15 de agosto). Municípios ricos no agronegócio não traduzem PIB em qualidade de vida em MS. Recuperado de https://www.campograndenews.com.br
- A Gazeta de Dourados. (2025, 15 de agosto). Municípios mais ricos do agro em MS têm baixa qualidade de vida, aponta estudo. Recuperado de https://www.agazetadedourados.com.br
- Souza, J. R. de, & Gomes, M. F. (2019). A modernização agrícola e o desenvolvimento regional no Sudoeste Goiano. Revista de Economia e Sociologia Rural, 57(3), 413–432. https://doi.org/10.1590/1234-56789-20190573